A hora do corpo | ||
Como a idade e outros fatores afetam o relógio biológico de cada um | ||
Por Filipe de Paiva | 18/01/2011 | |
Dormir menos com o passar do tempo, ficar desorientado e mal humorado com mudanças de fuso horário, sentir fome fora de hora. Todos nós conhecemos alguém que sofre com a irregularidade – ou a regularidade excessiva – de seu ritmo interno. É que o relógio do corpo nem sempre corresponde aos horários estabelecidos socialmente e a simples quantidade de luz em um lugar pode influenciá-lo, explicam cronobiólogos, cientistas responsáveis por estudar as funções temporais dos seres vivos. Ponteiros desajustados insônia, ansiedade, fadiga e até depressão, alertam especialistas. O primeiro passo para evitar problemas é acertar o ritmo circadiano, uma expressão que vem do latim “circa diem” e significa “cerca de um dia”. Cada ritmo circadiano (sim, existem vários atuando no organismo, e o mais famoso é o responsável por controlar o sono) respeita um ciclo de aproximadamente 24 horas. A ciência que estuda estes ritmos é a cronobiologia. Segundo Edson Delattre, doutor em Ciências Biológicas e pesquisador de Ritmos Circadianos no Departamento de Fisiologia e Biofísica da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), a comunidade científica acredita que a evolução favoreceu os seres que possuíam um relógio interno. “Os demais pereceram”, diz. São os ritmos circadianos que estão por trás do dormir e do acordar. “Embora estes ritmos sejam gerados pelos próprios organismos, eles são ajustados aos ciclos ambientais”, explica o professor John Fontenele Araujo, do Núcleo de Pesquisa em Ritmicidade, Sono, Memória e Emoção do Departamento de Fisiologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). A própria rotação da Terra influencia neste processo, pois é ela que origina os dias e as noites. A retina comunica ao cérebro, através dos nervos ópticos, se está claro ou escuro. A informação é enviada, então, para o Núcleo Supraquiasmático (NSQ), que fica localizado em uma região do cérebro chamada hipotálamo. É o NQS que controla o relógio biológico, os horários do corpo. A lógica é simples. Quando há luz, o corpo recebe a ordem de diminuir a produção de melatonina. Quando está escuro, a produção aumenta. A melatonina é um hormônio que estimula as estruturas cerebrais responsáveis por relaxar e induzir ao sono. É por isso que durante o dia se está no chamado estado de vigília, que se usa para trabalhar, estudar e se exercitar; e à noite a preferência é por atividades mais tranqüilas e, por fim, uma cama bem confortável. “Ela ajusta o organismo para dormir”, diz Araujo sobre a melatonina. A luz e sua ausência são as responsáveis por manter o relógio humano em bom funcionamento. “No caso do ser humano, o ciclo claro-escuro é o agente sincronizador fundamental”, afirma Delattre. O relógio biológico é tão forte que, mesmo em um lugar onde não seja possível identificar se está claro ou escuro, como uma caverna, ele mantém os horários aos quais se acostumou. Isto dá uma noção de dia ou noite, mesmo que não haja como saber com certeza. Mas passar tempo demais em um local como este pode desajustar o relógio. Além disso, há um leque de fatores que podem desorientar os ritmos circadianos, e quando eles saem dos trilhos, os resultados incluem insônia, ansiedade, fadiga, mau humor e até depressão. A idade é um deles. Ao envelhecer, algumas células começam a ser perdidas – inclusive no cérebro. Isto afeta o NQS e, consequentemente, a produção de melatonina. O cérebro “esquece” de mandar o corpo produzir melatonina, e como resultado o relógio biológico dos idosos perde sua sincronia, fazendo com que muitos tenham dificuldades para dormir. “Além disso, os nossos olhos ficam menos sensíveis à luz, prejudicando mais ainda nossa capacidade de sincronização”, alerta Araujo. Delattre reitera que o envelhecimento prejudica a consolidação do sono e diminui sua estabilidade.
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